Thursday, July 20, 2006

Hegemonia não é invenção de lunáticos de direita!

Nada do que está nesse blog é invenção para fins políticos ou partidários, tudo que disponibilizamos aqui pode ser comprovado nas fontes disponíveis na web. Por isso preferimos pôr links pró e contra Gramsci, para que o leitor tire suas próprias conclusões através do exame das opiniões diversas. Quando meu amigo Gustavo Escher afirmou que há uma hegemonia, no sentido gramsciano, da esquerda no Brasil, ele não estava errado, e ela foi muito bem planejada.
Já não se pode mais negá-la ou escondê-la!! A verdade é filha do tempo, dizia Santo Agostinho...

Leiam esse enxerto, retirado de um dos links pró-Gramsci, e saibam porque todo professor de história é de esquerda:

" Teoricamente, o debate dos educadores encontrou nos escritos de Antonio Gramsci um grande alento. Presenciamos a uma verdadeira “gramscimania”, isto é, a uma excepcional difusão dos escritos desse intelectual marxista italiano. Calcula-se que mais de 40% das dissertações e teses de pós-graduação em educação, produzidas na década, citavam Gramsci como principal referência teórica. Suas frases eram citadas, em epígrafe, nos projetos ou propostas de política educacional de várias secretarias de educação, estaduais e municipais. O nome de Gramsci era citado com grande freqüência nos congressos e nas reuniões das várias associações científicas e sindicais dos educadores. A literatura sobre ele e dele era sempre bem-vinda e até mesmo bem vendida.
O primeiro saldo positivo decorrente dessa onda de estudos marxistas, sobretudo da visão gramsciana, foi o abandono por parte dos educadores do velho marxismo ortodoxo stalinista e a adoção sistemática da crítica ao tradicional didaticismo técnico. Privilegiou-se a visão teórica que explica o fenômeno escolar pela sua relação com a sociedade, com a economia e com a política. O discurso repleto de citações gramscianas era, para os educadores de duas décadas passadas, elemento de distinção cultural que os prestigiava com relação aos tradicionais pedagogos didaticistas. Gramsci e também Paulo Freire tornaram-se bandeiras de orgulho e estímulo para a organização político-sindical dos pedagogos.
Observe-se, também, que durante esses anos de transição do autoritarismo militar para a democracia ganhou relevância o termo de
educador, sobrepondo-se ao de professor, justamente porque educador semanticamente explicitava a necessidade do engajamento ético-político dos professores. Com efeito, o conceito de educador transcende o de professor. Este refere-se às competências específicas adquiridas por uma pessoa, que as transmite a outras, ensinando-as e treinando-as. Aquele refere-se à responsabilidade na formação integral do cidadão, à cumplicidade radical entre educando e educador. O professor que não assume plenamente a função de educador e se exime de sua responsabilidade de ensinar a leitura do mundo, para restringir-se à leitura das palavras - utilizando expressões freirianas -, era considerado um técnico asséptico, reducionista, que reeditava na prática pedagógica a velha tese da neutralidade científica.
Enfim: durante os anos oitenta, o pensamento pedagógico se modernizou, se arejou ao assumir sua dimensão de engajamento político. Novos conceitos e novas perspectivas teórico-práticas enriqueceram os debates no campo da educação, onde com muita freqüência utilizavam-se termos e conceitos até então desconhecidos, como: sociedade civil e política - hegemonia - ideologia e contra-ideologia - intelectuais orgânicos e tradicionais - a educação como ato político-partidário - educação e cidadania, etc. Mais ainda: politicamente, a maioria dos educadores dos anos oitenta, sabedora de que a escola não se explica por ela própria e sim pela relação política que mantém com a sociedade, lutou para colocar na administração educacional partidos e homens compromissados com os objetivos da escola popular e libertadora. Até mesmo redutos tradicionalmente mais fechados, como os dos
especialistas da educação (orientadores educacionais, administradores ou gestores, supervisores, diretores, etc.) foram influenciados pela idéia do ato pedagógico ser ao mesmo tempo um ato de compromisso político. Nos congressos de área (nacionais, estaduais, regionais e municipais), os especialistas da educação afirmavam que a relação pedagógico-científica era fundamentalmente uma relação de hegemonia política. Assim, instigavam professores a buscarem uma forma de relação profissional que fosse ao mesmo tempo uma nova relação hegemônico-política, isto é, a hegemonia da classe trabalhadora.
Como vimos, esse movimento político dos educadores, ao longo desses últimos vinte anos, engrossou o movimento político nacional que desaguou nas vitórias eleitorais do Partido dos Trabalhadores, nos estados, nos municípios e, hoje, na federação. "(...)
grifos meus.

Leia o texto na íntegra aqui


Tuesday, July 11, 2006

Não percam o artigo de Diego Casagrande A Revolução Silenciosa.
Indicado no blog do Luís Afonso Assumpção

Wednesday, June 21, 2006

O PT e a Estratégia Gramsciana - I

Gustavo Escher
especial para O Anti-Gramsci. gescher@hotmail.com

Resumo: As idéias de Gramsci, aplicadas em escala maciça por intelectuais orgânicos através da “conquista dos espaços”, hipnotizaram grande parte do povo brasileiro, permitiram a completa inversão dos valores que hoje vemos, e, consequentemente, a chegado do PT ao poder.

Introdução

Uma revolução silenciosa está em curso na alma de muitos brasileiros. O responsável é um ex-líder operário, proveniente de uma região pobre de um país católico e cheio de desigualdades... mas calma, não é o presidente Lula. Nosso governante, sabendo ou não, é apenas mais um de seus arautos.

Alguns resultados dessa revolução já são visíveis: muitos ricos sentem vergonha de ser ricos, sofrendo de um complexíssimo complexo de culpa, parecido com o do governador de SP; banqueiros e empresários idolatram comunistas e bandidos, como se fossem santos e heróis do povo; o roubo e a invasão de propriedade estão justificados se for por uma causa justa; do mesmo modo, um crime contra a vida cometido por um pobre zé-ninguém marginalizado é menos grave que uma verba desviada por alguém de bom nível sócio-cultural, como se o patrimônio valesse mais que a vida humana; a polícia deve medir suas ações e moderar o uso da força contra os bandidos, pois, coitados, já sofreram demais na vida; estudantes,que mal podem compreender um livro ou um regra gramatical, sabem de cor os responsáveis pelas injustiças do mundo e, melhor ainda, sabem até como resolvê-las; consagram-se, na mídia, na constituição¹, e na boca do povo, expressões como “justiça social”, “função social”, “inclusão social”, “dever social”, mas ninguém sabe muito bem, ou fingem não saber, o que significam, o importante é lutar por eles na construção de uma “sociedade solidária” e depois ir para a cama com a consciência tranqüila de quem está contribuindo para o melhor da humanidade. E por aí vai...

Contudo, nada disso é fortuito, nada ocorreu por acaso. Por trás desse mar de atitudes aparentemente desconexas há um nome, um nome sagrado nas universidades brasileiras e nos círculos intelectuais petistas: Antonio Gramsci. Tentaremos resumir aqui como coisas tão diversas têm suas raízes comuns na obra do fundador do Partido Comunista Italiano. Ele é a poisonous tree que contamina a sociedade com seus frutos, belíssimos por fora, mas podres por dentro.

Resumo da estratégia gramsciana² e sua atuação e influência em diversos campos

É importante estudar Gramsci porque ele é o teórico da nova estratégia comunista de tomada do poder. E para colaborar com essa estratégia não é preciso ser de esquerda ou acreditar no socialismo, basta aceitar e repetir os lugares-comuns da retórica esquerdista que, em breve, você estará agindo e pensando, quase que por prestidigitação, como um verdadeiro socialista.

Ao contrário da teoria leninista de tomada violenta do poder através do golpe de estado, Gramsci defendia uma lenta revolução psicológica, que primeiro atingisse a mente dos homens e, assim, fosse aos poucos preparando o terreno para a tomada real do poder. Seu objetivo era fazer com que as pessoas pensassem e agissem como comunistas antes de viverem num verdadeiro estado comunista. Esse domínio psicológico sobre as massas Gramsci chamou de hegemonia. Dessa forma, gramscismo significa conquistar primeiro a hegemonia para depois conquistar o poder, este entendido como o controle do aparelho do estado, da polícia, etc. Como afirmou Olavo de Carvalho³, a estratégia leninista está para a gramsciana assim como o estupro está para a sedução.

Na luta pela hegemonia o importante é transformar o “senso comum” dos homens. Senso comum, para Gramsci, são os hábitos, os gestos, os modos de falar, as atitudes mentais conscientes ou inconscientes, que são comuns a todos os homens. É o “Deus me livre!”, o “Jesus!”, comuns a todas as classes, ricos ou pobres. Gramsci quer, justa e sutilmente, alterar esse fundo comum, mais sentimental e imaginativo que racional, e, na civilização ocidental, nitidamente cristão. Nessa transformação os intelectuais têm um papel fundamental.

Para Gramsci todo homem é um intelectual, mas para a mudança da sociedade Gramsci divide os intelectuais em dois tipos. Há o intelectual tradicional ou inorgânico, que não têm ideologia de classe nem classe definida, e há o intelectual orgânico, esse sim o ideal de intelectual gramsciano e responsável pela transformação do senso comum. Os orgânicos cumprem uma função organizadora na sociedade e estão conscientes de sua posição de classe. Podem exercer as mais diversas profissões, em qualquer campo, podendo ser desde padres a ministros do estado. Porém, em comum possuem a missão de reorganizar o senso comum através da criação de novos símbolos, imagens e idéias que moldem a consciência das massas.

Milhares de intelectuais orgânicos atuando sem vínculo político aparente e em diversos canais é muito mais eficiente para a conquista da hegemonia, principalmente se aparentam não receber ordens de um comando central. Através de jornalistas, pedagogos, artistas, pode-se, imperceptivelmente, inocular novos sentimentos, novas palavras, novos hábitos, que vão, lentamente, substituindo os antigos valores e princípios. Gramsci sabia que a pregação sutil camuflada é muito mais eficiente que a pregação aberta. Uma seqüência bem editada de notícias no telejornal pode produzir o efeito desejado, como, por exemplo, mostrar uma reportagem sobre a fome no nordeste ou na África depois de outra que mostrava os problemas causados pela obesidade em São Paulo ou em países ricos. A conclusão nas cabeças dos telespectadores será quase imediata: “Que mundo injusto. Uns com tanto, outros com tão-pouco” ou “O capitalismo é mesmo perverso!”. A adesão em massa dos brasileiros ao bom mocismo esquerdista e ao politicamente correto deve-se, em parte, a esse tipo de estímulo contraditório, como veremos adiante.

Dessa forma, afirma Olavo de Carvalho4, “basta que intelectuais comunguem, ainda que vagamente, com o espírito revolucionário gramsciano, para que, numa espécie de cumplicidade implícita, cada qual realize sua tarefa e todos os resultados venham a convergir na direção dos fins gramscianos”. Como se não bastasse, Gramsci propõe ainda que os intelectuais orgânicos substituam os antigos princípios e valores da humanidade por outros baseados no conceito de “historicismo absoluto”. O historicismo absoluto é a eliminação do critério tradicional de verdade e falsidade na busca do conhecimento objetivo, e sua substituição pela mera “adequação” das idéias a um determinado estado de luta social. Para uma teoria ser verdadeira, por exemplo, exigir-se-ia apenas que expressasse seu momento histórico e as aspirações dos revolucionários. A atividade intelectual não passa, assim, de mera propaganda política. É o fim da autonomia da inteligência e da fé na busca da verdade, condições mesmas para o exercício intelectual.

É fácil perceber que para a conquista da hegemonia as esferas da cultura e da educação ganham um peso considerável, devendo ocorrer uma verdadeira “guerra de posições”, como notou um marxista notório. Leandro Konder5 nos lembra que:

“(...) Nenhum marxista antes de Gramsci havia reconhecido uma importância política tão grande na batalha das idéias, nos conflitos culturais. Para o teórico italiano, o avanço e a consolidação do movimento dos trabalhadores, numa sociedade de tipo “ocidental”, depende de uma sempre difícil “guerra de posições”, depende de um bom planejamento, de uma eficiente organização, quer dizer, depende de conhecimentos, necessita de uma sólida preparação.

Ao contrário da “guerra de movimentos”, que se faz muitas vezes com manobras súbitas de pequenos grupos, com ações fulminantes de minorias (agindo em nome da maioria), que se serve de golpes de mão, a “guerra de posições” exige a participação ampliada, a construção do consenso.

Na “guerra de posições” cada avanço precisa ser bem calçado. A mobilização só pode ser suficientemente profunda e ter efeitos duradouros se puder se apoiar em consciências coesas e articuladas, em um pensamento rigoroso e lúcido. A transformação da sociedade, nas condições da complexidade moderna, não poderá seguir um caminho revolucionário se não aproveitar as lições proporcionadas pelos duelos da política cultural.

Em outras palavras, para passar da rebeldia à revolução, da contestação à construção de alternativas, a perspectiva com que os socialistas enfrentam os combates que travam pelo fortalecimento da “sociedade civil” necessita de instrumentos teóricos e de uma competência argumentativa que só poderão ser desenvolvidos no campo de batalha da cultura.

E Gramsci dá indicações metodológicas preciosas para a ação revolucionária nesse campo (...).”

Na educação, por mais que seus fãs tentem mostrar o contrário, Gramsci está mais preocupado em formar futuros intelectuais orgânicos do que em formar homens de verdade. Sua pedagogia é pura doutrinação e sua influência pode ser constatada principalmente nas obras de Paulo Freire6 e na educação de adultos empreendida pelo MST. Um texto, escrito a quatro mãos (!)7, nos diz:

A temática pedagógica ocupa um caráter não secundário na experiência vivida e no pensamento de Antonio Gramsci, seja como interesse educativo imediato a nível individual, ou como luta política pela organização da cultura em nível de massa.

“A preocupação educativa em Gramsci é verificada concretamente através de seus escritos no cárcere. Ele exprime interesse pela educação quando afirma em uma carta à sua esposa: “A questão escolar interessa-me muitíssimo” (Manacorda, 1990, p.15). Ele mesmo ressalta o vínculo objetivo entre pedagogia e política, quando sublinha que "essa relação (pedagógica) existe em toda a sociedade, no seu conjunto”, ou quando coloca a escola como uma atividade essencial no futuro (ibid).

“Segundo o pensamento de Gramsci, é fundamental o processo de educação das massas para que estas possam se inserir de modo ativo e consciente na vida política. Para ele, a atividade de educação das massas é realizada sobretudo através da mediação dos “intelectuais”, isto é, dos indivíduos que organizam e difundem a concepção de mundo de uma classe social que, emergindo no terreno da produção econômica, procura exercer o seu governo sobre a sociedade. Como “funcionários” de uma determinada classe social, são eles que realizam as funções subalternas da hegemonia social, procurando obter o consentimento das grandes massas ao domínio político da classe social à qual estão organicamente vinculados.

Gramsci considera a escola a principal agência, na sociedade civil, de formação de intelectuais. De modo especial, preocupa-lhe a preparação de intelectuais de novo tipo, organicamente ligados às classes subalternas, para que possam influir no processo da hegemonia civil, educando e formando os “simples”, ou seja, elaborando e tornando coerentes os problemas que as massas populares apresentam em sua atividade prática para, assim, constituir um novo “bloco cultural e social”. É dentro dessa linha de raciocínio que Gramsci discute a organização da escola, pois a considera uma das mais importantes instituições que movimentam o conteúdo ético estatal, isto é, das ideologias que circulam na sociedade civil seja com a finalidade de legitimar o grupo dominante tradicional, ou de lutar contra ele para fundar uma nova sociedade”.

Prosseguem as referidas autoras, agora sobre o papel do professor:

“A reforma da escola de que necessitamos passa pela presença desta figura maiúscula do intelectual construtor, organizador, persuasor permanente, que, da técnica-trabalho, consegue chegar à técnica-ciência e à concepção humanista histórica, rompendo assim com a condição de “especialista” e tornando-se “dirigente”, isto é, um especialista mais político.

É, portanto, tarefa política dos programas de formação continuada promover a “reforma intelectual e moral” dos professores. Isso consiste em elaborar uma filosofia que, partindo do “senso comum” dos mesmos e ligada à vida prática das massas, mesmo que de forma implícita, tenha possibilidade de difusão, tornando-se um sendo comum renovado”.

(...)“O “intelectual docente” deverá ter uma instrução permanente, decorrente das estruturas organizativas das academias e universidades, não podendo sofrer “descontinuidade” entre os níveis: elementar, médio e superior. Nesse processo de instrução permanente, deve-se formar um novo intelectual, preocupado e militante da política, do sindicato, do bairro e da comunidade e sociedade a qual está inserido”.

A pedagogia gramsciana está preocupada em formar Boffs, Bettos, Saders, Stédiles e Chauís, entre outros. O ideal intelectual do intelectual gramsciano é ser um pseudo-intelectual. É formar homens medíocres que, incapazes de aceitar a vida ordinária e o próprio fracasso como o faz a maioria dos homens comuns, querem alterar a realidade para ver se assim conseguem ser importantes.. Esses homens, na maioria provenientes da classe-média, não estão preocupados com os pobres, querem apenas realizar seus delírios de grandeza. São, como disse Voegelin8, analfabetos funcionais com forte desejo de engrandecimento... Gramsci, ao invés de querer despertar as possibilidades latentes na alma dos indivíduos, quer aprisioná-los no mundo da ideologia, limitar-lhes os horizontes, mantê-los presos para sempre na mesquinhez da consciência de classe. Não é por acaso que faz sucesso na pedagogia brasileira. Vejam o que propõe para o ensino básico9:

"O primeiro grau elementar não deveria ultrapassar três, quatro anos e, ao lado do ensino das primeiras noções “instrumentais” da instrução (ler, escrever, fazer contas, geografia, história), deveria desenvolver notadamente a parte relativa aos “direitos e deveres”, do Estado e da sociedade, como elementos primordiais de uma nova concepção do mundo que entra em luta contra as concepções determinadas pelos diversos ambientes sociais tradicionais, ou seja, contra as concepções que poderíamos chamar de folclóricas*”. (*Folclore é a mesma coisa que senso comum).

Quanto mais jovem melhor... Mas a influência de Gramsci não se limita apenas à pedagogia. É dele também a idéia de “centro” e “periferia”, que influencia as relações internacionais e a sociologia, e a noção de “cultura popular”, que, misturada com o nacionalismo, gera mais confusão que cultura de qualidade. Pode-se notar, ainda, a influência de Gramsci na Escola de Frankfurt e nos trabalhos de Althusser e Edward Said. Alguns autores10, estrangeiros principalmente, também vêem Gramsci como o pai teórico da Nova Ordem Mundial e da perestroika, esta entendida como uma virada estratégica rumo à dominação mundial através de uma lenta revolução cultural encabeçada pelo ecologismo. Isso é importante quando lembramos que Gramsci (e todo marxista) via o marxismo como uma filosofia capaz de criar, através da luta cultural, uma nova concepção global do mundo e uma nova “vontade coletiva”, baseada na igualdade e no pacifismo. O ecologismo, no caso, representaria o interesse da humanidade, o “bem-comum”, e, em nome desse bem-comum, lentamente o coletivo se imporia sobre o individual, o mundialismo sobre o nacionalismo, o império da lei mundial sobre a lei local. Essa hipótese, ainda que ignorada pelos estudiosos acadêmicos das relações internacionais, não deve ser desprezada, principalmente após constatarmos que Gorbatchov tornou-se um militante ecológico11.

O PT e a Estratégia Gramsciana - II

continuação...

Gramsci e o Socialismo Petista

Fato notório é que o Brasil foi um dos primeiros países, depois da Itália, a ter editados os escritos de Antonio Gramsci. Isso se deve, em grande parte, como vimos, à importância que a palavra intelectual recebe na obra do italiano e ao papel de destaque que estes possuem na formação da ideologia de classe. Acontece que o sentido tomado por essa palavra no Brasil não é o de um homem solitário que busca a verdade com a consciência respondendo, em última instância, diretamente à Deus. Somos filhos da modernidade, da época das ideologias e da política como religião, e, nesse sentido, intelectual é, para muitos de nós, o homem preocupado mais com programas políticos do que com a verdade da alma, preocupado mais em participar do que em entender, mais em transformar do que em compreender a realidade.

Somos, ainda, um povo estético e erótico12: sentimos mais que raciocinamos, queremos aparentar algo que não somos, somos superficiais. Acreditamos ainda no mito rousseauniano de que o homem nasce bom e de que é a sociedade que o corrompe. Sempre queremos primeiro mudar a sociedade para depois mudar os homens. Por isso estamos prontos a aceitar qualquer novidade que aparente trazer a cura dos males do mundo e que nos permita, ao mesmo tempo, posar como avant-garde intelectual. Primeiro foi o liberalismo antimonárquico, depois o positivismo e o fascismo, com o apelo à ordem para o progresso, depois o Marxismo e suas variantes, com o apelo à justiça terrena. Todas foram importadas por intelectuais de classe-média com o intuito de transformar a sociedade e não de interpretá-la. Agora é o gramscismo, e ele é perverso justamente por querer transformar o mundo sem ser notado, como se houvesse ocorrido uma mudança natural. A ironia é que Gramsci sabia muito bem, como os antigos, que a sociedade é formada pelo conjunto dos homens e que, se queremos transformá-la, primeiro devemos transformar os homens. Aqueles que aceitam conscientemente fazer parte dessa estratégia são réus confessos de crime contra a humanidade. E entre esses estão os ideólogos e militantes petistas.

O boom do gramscismo no Brasil ocorreu após o fracasso da luta armada e deveu-se, talvez, à falta de outras propostas revolucionárias disponíveis no momento. Gramsci foi visto, e é visto, como potencial renovador da ação socialista principalmente devido ao caráter não violento da luta revolucionária que propunha e a sua aparente falta de radicalismo. Não é exagero afirmar que a conquista da hegemonia deu um grande salto justamente no período militar. É nessa época, por exemplo, que são editadas as obras mais importantes de esquerda e que se efetiva a “ocupação dos espaços”, principalmente universitários e midiáticos. A tomada do poder, contudo, torna-se mais factível apenas a partir dos anos 90, com a desmoralização da classe política dita “tradicional” em sucessivos escândalos.

A vitória do PT nas urnas e a atração que este exerce sobre grande parte dos jovens são frutos da estratégia gramsciana, a qual foi pela primeira vez empregada em larga escala na Campanha pela Ética na política, nos anos 90. O programa do PT é gramsciano, assim como todos os homens de esquerda desse país, ainda que os adeptos declarados sejam poucos. Observar o vocabulário empregado por intelectuais e militantes em textos e discursos é mais que suficiente para comprovar essa tese. Um documento revelador da estratégia petista é um texto aprovado no 7º Encontro Nacional do PT, em 1991, e intitulado O Socialismo Petista. Constam no referido documento13:

“Na raiz do nosso projeto partidário está, justamente, a ambição de fazer do Brasil uma democracia digna desse nome. Porque a democracia tem, para o PT, um valor estratégico. Para nós, ela é, a um só tempo, meio e fim, instrumento de transformação e meta a ser alcançada.”(...)

“Outra dimensão visceralmente democrática do PT é o seu pluralismo ideológico-cultural. Somos, de fato, uma síntese de culturas libertárias, unidade na diversidade. Confluíram para a criação do PT, como expressão de sujeitos sociais concretos, mais ou menos institucionalizados, diferentes correntes de pensamento democrático e transformador: o cristianismo social, marxismos vários, socialismos não-marxistas, democratismos radicais, doutrinas laicas de revolução comportamentaletc.

O ideário do Partido não expressa, unilateralmente, nenhum desses caudais. O PT não possui filosofia oficial. As distintas formações doutrinárias convivem em dialética tensão, sem prejuízo de sínteses dinâmicas no plano da elaboração política concreta. O que une essas várias culturas políticas libertárias, nem sempre textualmente codificadas, é o projeto comum de uma nova sociedade, que favoreça o fim de toda exploração e opressão.”(...)

“O que legitima os contornos estratégicos definidos de qualquer projeto socialista é a convicção radicalmente democrática e transformadora de amplos segmentos populares. Pode-se dizer, sem indevido triunfalismo, que tal pedagogia política, baseada na auto-educação das massas por meio de sua participação civil, revelou-se, no geral, acertada”(...).

Outro documento importante14, fruto do 1º Congresso do Partido, realizado também em 1991, consagra o tipo de socialismo almejado pelos petistas. Nele, reafirma-se a opção por uma democracia socialista, de contornos vagos, que não é nem socialismo real, tampouco social-democracia (incisos 97 em diante). O PT busca um socialismo “humanista” e “radicalmente democrático”, que não aceita a ditadura do proletariado nem o mercado capitalista, mas no qual é possível a existência de um Estado de Direito e a pluralidade de opiniões. O fundo comum que move os homens nessa busca é a crença na construção de uma nova sociedade:

97.Lutamos por uma ordem social qualitativamente superior, baseada na cooperação e na solidariedade, na qual os conflitos sejam vividos democraticamente”.

É também nesse documento que o PT assume sua luta pela hegemonia em diversas frentes: “132.O Partido dos Trabalhadores reconhece que a organização de diferentes setores sociais (mulheres, negros, juventude, homossexuais etc.), seu direito de lutar e reivindicar pela definição das prioridades sociais, econômicas e políticas e sua presença na disputa pelos rumos da nova sociedade são também uma garantia da construção de uma sociedade socialista democrática”.

A tática é simples: ao não optar por nenhum dos dois tipos de governo socialista politicamente consagrados, um mais brando e outro ditatorial, ao mesmo tempo em que propõe um tipo de socialismo de definição confusa, evita-se, em tese, maiores discussões ideológicas dentro do partido e da sociedade, e, ao mesmo tempo, torna-se possível atrair novos setores da população para suas idéias, pois quem não quer uma sociedade mais justa? O socialismo vai perdendo, assim, seu caráter aparente de luta de classes – embora não o abandone –, e ganha um novo sentido na cabeça das pessoas, ainda que vago, porém muito mais palatável. As pessoas passam a aceitar o que antes viam com desconfiança. Isso é Gramsci. A síntese da política petista é essa:

152. (...) no atual período, (...), a disputa da hegemonia supõe uma ação simultânea no terreno político, social e ideológico. Engloba o trabalho nas instituições, onde atuamos no sentido de alargar as fronteiras da participação, da democracia, da cidadania e da afirmação da sociedade sobre o Estado. Inclui a diversidade das lutas sociais não institucionais e nem sempre legais. Incorpora a construção dos instrumentos organizativos pelos quais os trabalhadores e a sociedade brasileira poderão definir os rumos do País. Envolve a disputa de idéias, a construção de uma nova cultura, de uma nova ética e de uma nova solidariedade social, que se contraponham aos valores dominantes. Em resumo, disputar hegemonia, hoje, significa construir um enorme movimento social por reformas em nosso país, essencial para viabilizar um caminho alternativo de desenvolvimento, que tenha entre suas principais características a incorporação à cidadania e ao trabalho de milhões de marginalizados e deserdados sociais existentes no Brasil”.

Ou, nas palavras de um petista, professor da UFMG15:

“À medida que as culturas do socialismo foram se descolando das concepções deterministas da história, que o concebiam como um desfecho inevitável ou fortemente tendencial das contradições do capitalismo, o conceito de utopia veio adquirindo novo sentido e valorização. De expressão de um movimento operário imaturo sociologicamente ou mera fantasia sem vínculos com a realidade, a utopia passou a designar, em um contexto em que a cultura liberal busca saturar todo o horizonte histórico, a capacidade de resistência dos pensamentos anti-capitalistas, a necessidade de alargar a imaginação dos movimentos sociais e partidos de esquerda para além dos limites do imediatamente possível, concebendo novas possibilidades de civilização alternativas àquela organizada pelo princípio do capital”.

Um passo importante na estratégia: a Campanha pela Ética na Política.

Essa nova concepção culminou na famosa Campanha pela Ética na Política. Segundo Olavo de Carvalho16, essa campanha nasceu como política anti-Collor, e não com intuito moralizador verdadeiro. Quando, depois, surgiram as denúncias de corrupção no governo Collor a campanha ganhou força e crédito suficiente para atrair para o PT grande parte da classe média, a qual em geral nunca se sentiu atraída pela esquerda. Mas, ainda segundo o referido autor, esse foi apenas o resultado mais aparente, algo muito mais profundo ocorrera17:

O que poucos perceberam é que a exigência ética da campanha fora formulada em termos propositadamente utópicos, autocontraditórios, estéreis, de modo a desgastar a classe política numa sucessão de rituais autopunitivos sem resultado proveitoso, até levá-la ao completo descrédito e precipitar a crise geral do Estado, onde as esquerdas, aí já plenamente identificadas como derradeira reserva moral, se apresentariam ao povo como única esperança de salvação. A quem esteja ciente de que, no pensamento gramsciano, as mutações psicológicas profundas são o alvo prioritário de um plano de largo escopo a ser realizado, basicamente, por um grupo de intelectuais, as peças múltiplas do quebra-cabeça começam a encaixar-se, formando a figura bifronte de uma estratégia da perversão moral em nome da moralidade: de um lado, esvaziar as velhas crenças morais, rebaixando-as e transformando-as em munição política de uso imediato contra os ‘inimigos de classe’; de outro, mais sutilmente, e num círculo mais seleto de ouvintes, solapar as bases intelectuais dessas crenças, promovendo uma mutação do sentido mesmo da palavra ‘ética’, para que, cortada dos laços que a ligam a quaisquer valores espirituais e a qualquer ideal de vida superior, passasse a significar apenas a adesão maquinal a certos slogans políticos e a hostilidade a certos grupos sociais, quando não a indivíduos em particular; para que deixasse, sobretudo, de ser uma regra para o homem governar a si mesmo, e se tornasse um pretexto edificante para cada qual projetar suas culpas sobre o vizinho, beatificando o instinto de delação e fazendo da maledicência a virtude primordial do cidadão brasileiro. Tratava-se em suma de reduzir a ética ao ‘politicamente correto’, tornando o apoio às esquerdas uma obrigação religiosa cujo descumprimento teria o efeito desequilibrante de uma transgressão, sujeitando o pecador a terríveis padecimentos interiores, a um sentimento de exclusão da comunidade humana, que o homem médio não saberia suportar sem buscar logo, arrependido, a oportunidade de uma penitência reconciliadora; oportunidade que a ‘campanha do Betinho’ providencialmente estendeu a todos no momento exato, com a precisão de um cronograma divino”.

A partir daí, qualquer um que se opusesse ou se mantivesse alheio ao ideal de esquerda passava a ser visto como imoral e malvado. Muitos sentiram-se como verdadeiros pecadores; outros, querendo agradar, ainda que a contragosto, fortaleceram ainda mais a esquerda, a qual de fato foi a verdadeira vitoriosa. A Ética foi corrompida, deixou de ser absoluta e tornou-se relativa, relativa aos interesses do partido... como pregava Gramsci. Será coincidência? A partir de então o terreno para a esquerda chegar ao poder estava aberto, era só questão de tempo. A vitória da esquerda não pode ser negada, por mais que seus seguidores digam o contrário. Marco Aurélio Garcia já reconheceu o fato18:

Tem havido nos últimos anos um deslocamento para a esquerda na América Latina, que não se traduz só nas eleições de presidentes, mas também na mudança da problemática política. Mesmo os que não vieram da esquerda hoje compartilham temas da esquerda. Há uma hegemonia do pensamento da esquerda na América Latina, da mesma forma em que na década anterior havia a hegemonia do pensamento conservador”.

Como vimos anteriormente, a esquerda passou também a atrair para o seu manto, sob o fundo moral de luta por uma sociedade mais justa, diversos temas progressistas como feminismo, homossexualismo, aborto, ação afirmativa, entre outros, sem que seus novos eleitores soubessem que na verdade estavam contribuindo para a estratégia gramsciana.

E até hoje é assim. Para não passarem por “conservadores”, “reacionários”, “direitistas”, os brasileiros, principalmente os jovens, preferem acreditar que “um outro mundo é possível”, sem saber, ou fingindo não saber, que estão colaborando com os regimes mais injustos e assassinos já criados neste mundo. É muita irresponsabilidade, para dizer o mínimo, acreditar no socialismo e culpar o capitalismo por todos os males do mundo. Só homens com a alma doente podem acreditar nisso.

Nada está perdido

Mas não deve haver lugar para o derrotismo. Novamente, Eric Voegelin nos lembra que o primeiro pressuposto para alguém aderir a uma ideologia é o de que o sujeito seja desonesto intelectualmente. Afirma também que ideologias são construções insustentáveis e que para dar sustentação às suas mentiras os ideólogos devem esconder grande parte dos fatos que, deixados à vista, fariam desabar toda sua argumentação. Os ideólogos destroem a linguagem, transformando-a em mera repetição de slogans ou em jargões intelectuais altamente complicados e inacessíveis para quem está de fora do seu círculo19. Talvez seja este o motivo por que os esquerdistas fujam sempre do debate apelando a ataques pessoais e à força do número: assim como é impossível criticar a metafísica sem tornar-se antes um metafísico, é impossível criticar os argumentos pró-capitalismo sem render-se ao capitalismo, ou estudar o socialismo sem desprezá-lo imediatamente. Porém, isso é ao mesmo tempo reconhecer que estava errado, o que definitivamente é para poucos. Diante da perspectiva de descobrir que viveram na mentira – alguns a vida inteira –, é preferível continuar no auto-engano, pois menos doloroso, e de preferência na companhia de outros mentirosos, pois a mentira coletiva têm a incrível capacidade de parecer verdade. Nesse sentido, além de andarmos sempre com um lenço e com um guia veterinário, pois nos serão úteis quando a agitprop vier espumando em nossa direção como cães hidrofóbicos, temos de recuperar o verdadeiro significado da linguagem e tirar o véu dos fatos que todo militante tenta esconder – seja no campo econômico, político, psicológico, espiritual, etc. Devemos mostrar que a linguagem do ideólogo não explica a realidade, mas apenas reflete seu afastamento dela20. Isso é difícil, mas não impossível.

Ao nosso lado estão os homens que antes de nós já iniciaram esse trabalho21, muitas vezes em condições bem piores, e a certeza de estarmos lutando pela verdade, no sentido tradicional e consagrado há mais de dois mil anos. Assim como o clarão da cidade ofusca o brilho das estrelas, as ideologias ofuscam o brilho da verdade. Para rever as estrelas basta sair da cidade, para encontrar a verdade basta entrarmos em nós mesmos. O amor à verdade repousa em todo homem.

O PT e a Estratégia Gramsciana - III (notas)

Notas:

1. A tal ponto que, José Afonso da Silva, autor de esquerda, classifica a constituição de 88 como do tipo “transformista: que prometem explícita ou implicitamente a transição para o socialismo democrático pluralista, como a de Portugal, de 1976 com a revisão de 1982, a da Espanha, de 1978, a do Brasil(por seu conteúdo social, sem prometer o socialismo)(...)”p. 169. Diz ele em outra passagem que, no art. 5º, “os direitos individuais estão contaminados de dimensão social” e que com isso, “transita-se de uma democracia de conteúdo basicamente político-formal para a democracia de conteúdo social, se não de tendência socializante. Quanto mais precisos e eficazes se tornem os direitos econômicos, sociais e culturais, mais se inclina do liberalismo para o socialismo. Transforma-se a pauta de valores: o liberalismo exalta a liberdade individual, formalmente reconhecida, mas, em verdade, auferida por pequeno grupo dominante; o socialismo realça a igualdade material de todos como a única base sólida em que o efetivo e geral gozo dos direitos individuais de liberdade encontra respaldo seguro”. p. 184, Afonso da Silva, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23ª ed. Malheiros Editores. Não custa lembrar que nada do que está ocorrendo hoje no Brasil seria possível se a crença na “bondade intrínseca” do socialismo não estivesse tão arraigada na mente dos brasileiros.

2. Resumo baseado principalmente em Carvalho, Olavo de, A Nova Era e a Revolução Cultural: Fritjot Capra & Antonio Gramsci, Rio, IAL & Stella Caymmi, 1994, (Disponível em www.olavodecarvalho.org), e em textos diversos publicados em http://www.artnet.com.br/gramsci/ e http://www.acessa.com/gramsci/, sites dedicados à divulgação da obra do italiano. As consultas diretas à obra de Gramsci foram poucas, e somente a versões digitais. Embora não valha como justificativa, lembro que os inimigos do liberalismo nunca leram um livro liberal. Recomendo os livros de Sérgio Augusto de Avellar Coutinho, embora não os tenha lido: Cadernos da Liberdade, Belo Horizonte, Ed.Sografe, 2003, e A Revolução Gramscista no Ocidente, Rio, Estandarte Editora, 2001.

3. Carvalho, Olavo de, A Nova Era e a Revolução Cultural: Fritjot Capra & Antonio Gramsci, Rio, IAL & Stella Caymmi, 1994.

4. idem.

5. in Gramsci e a crítica da modernidade; Jornal do Brasil, 2 jun. 2001. Caderno Idéias-Livros, p. 8. Disponível em http://www.artnet.com.br/gramsci/arquiv163.htm

6. v. Mayo, Peter. Gramsci, Freire and Adult Education. Master Dissertation, University of Alberta, 1989.

________. Gramsci, Freire and Critical Pedagogy. London, Zed Books, in press.

Citados por Morrow, Raymond A.; Torres, Carlos Alberto. Gramsci e a Educação Popular na América Latina. Percepções do debate brasileiro. In Currículo sem Fronteiras, v. 4, n. 2, pp. 33-50, Jul/Dez 2004. Disponível em: http://www.curriculosemfronteiras.org/vol4iss2articles/morrow.pdf

7. Rodrigues, Margarita V.; Paranhos Silva, Cristina Beatriz ; Salgado, Edna ; Ribeiro Neves, Mariza Helena S.. Gramsci e a Educação. Em: http://www.uniube.br/institucional/proreitoria/propep/mestrado/educacao/revista/vol02/05/art01.htm

8. Voegelin, Eric. Autobiographical Reflections, p. 49.Louisiana State University Press,1996.

9. Gramsci, A.. Os intelectuais e a organização da cultura. p. 121, 8.ed. Rio de janeiro, Civilização Brasileira,1991. Citado por Rodrigues, Margarita V.; Paranhos Silva, Cristina Beatriz ; Salgado, Edna ; Ribeiro Neves, Mariza Helena S.. Gramsci e a Educação.

10. Bernardin, Pascal. L’Empire écologique écologique ou la subversion de l’écologie par le mondialisme, p. 8. Éditions Notre-Dame des Grâces, 1998. Citado em artigos disponíveis em www.olavodecarvalho.org

11. Sobre esses temas não posso me aprofundar mais, pois não os estudei com profundidade. Se, em alguns anos, persistir o silêncio acadêmico em torno de esse arrazoado, as chance dele estar correto é grande... Já os exemplos de doutrinação escolar, no Brasil e nos EUA, podem ser encontrados com profusão na internet. Isso não é paranóia “direitista” ou qualquer coisa do tipo, é fato, e é um fato grave. Recomendo, para o caso brasileiro, a visita a http://www.escolasempartido.org.

Vejo influência de Gramsci também no geógrafo, e teórico da globalização, Milton Santos. Consciente ou inconscientemente, ele resumiu a estratégia gramsciana numa entrevista publicada em livro: “Se trabalhamos com variáveis dinâmicas, produzimos uma interpretação sistêmica e durável, porque a variável escolhida já inclui o sentido da duração. Então, produzimos ao mesmo tempo uma interpretação e oferecemos o pano de fundo para a mudança possível. Nesse caso, as disciplinas que trabalham com variáveis dinâmicas são, todas, instrumentais por mais teóricas que também sejam. E o partido ainda é insubstituível, caso ele tenha bons filósofos ou intelectuais que ajudem na produção do seu discurso, sem estar obrigado ao compromisso com a ação. Porque tem que haver a elaboração do discurso, não basta a idéia. É o mundo da ideologia: se o mundo foi feito pelo discurso, tem que ser reconstruído pelo discurso. Isso talvez dê essa premissa ao papel do intelectual. O mundo atual é movido pelo discurso; nosso trabalho é oferecer o contra-discurso. E os partidos têm os especialistas do discurso”. Partindo de um intelectual honesto – pelo que conheço de sua biografia –, esta passagem decreta a morte da filosofia no Brasil: não se quer reconstruir o mundo desmascarando-se o velho discurso a partir da realidade, mas sim substituindo-o por um novo, pois é o mundo da ideologia... ver Território e Sociedade. Entrevista com Milton Santos, Seabra, Odete; Carvalho, Mônica de; Corrêa Leite, José. SP, Fundação Perseu Abramo, 2ª ed., 2001.

12. Digo isso baseando-me principalmente nas obras de: Vieira de Mello, Mário. Conceito de uma Educação da Cultura com referência ao Estetismo e à criação de um espírito ético no Brasil. Ed. Paz e Terra, 1986; Desenvolvimento e Cultura. O problema do estetismo no Brasil, SP, Nacional, 1950. O Humanista. A Ordem na alma do Indivíduo e na Sociedade. 1ª ed. Topbooks. 1996. E Meira Penna, J. O. de. A Ideologia do século XX. Ensaios sobre o Nacional-socialismo, o Marxismo, o Terceiro-mundismo e a Ideologia Brasileira, Rio, Nórdica,1994; Em Berço Esplêndido. Ensaios de Psicologia Coletiva Brasileira, 2ªed., Rio, Topbooks, 1996.

13. Disponível em http://www.paginasdinamicas.com.br/pt_historia/pg_dinamica/bin/pg_dinamica.php?id_pag=40

14. Resolução disponível em http://www.fpa.org.br/especiais/pt25anos/documentos/socialismo.pdf

15. Disponível em http://www.fpa.org.br/especiais/pt25anos/textos/utopia.htm

16. Carvalho, Olavo de. O Jardim das Aflições. De Epicuro à Ressurreição de César. Ensaio sobre o Materialismo e a Religião Civil, p. 287, SP, É Realizações, 2ªed., 2000.

17. Idem, p. 290.

18. em entrevista no Jornal O Globo de 15/10/2005

19. Voegelin, Eric. idem, pp. 45-49.

20. ib., p. 18.21.

21. As obras de ex-esquerdistas arrependidos como Arthur Koestler, Irving Kristol, David Horowitz,
Milovan Djilas, Daniel Bell, Paul Johnson, são importantíssimas. Sobre a degeneração da linguagem, estudar as de Karl Kraus, George Orwell, Eric Voegelin, entre outros. A meu ver, algo parecido ao esforço realizado por Kraus (mostrar como a corrupção semântica do idioma alemão favoreceu a ascensão de Hitler) tem sido feito por Olavo de Carvalho. Há também, é claro, os clássicos de Soljenitsin. No campo econômico, as obras de von Mises, Hayek, Böhm – Bawerik, entre outros, continuam imbatíveis.


Tuesday, June 13, 2006

Gramsci por Olavo de Carvalho

Monday, May 29, 2006

O pensamento de Gramsci

por Carlos I.S. Azambuja em 28 de abril de 2005
Resumo: O socialismo proposto por Gramsci não passa pelos proletários e camponeses, e sim pela cultura e pelo efeito multiplicador dos meios de comunicação, buscando, através de métodos persuasivos, mudar a mentalidade vigente em uma sociedade. © 2005 MidiaSemMascara.org

"Diz Goethe, quando a gente não sabe o que fazer, uma palavra é como uma tábua para o náufrago”.

(Olavo de Carvalho, “O Jardim das Aflições”)

O italiano Antonio Gramsci, um dos fundadores do Partido Comunista Italiano, foi o primeiro teórico marxista a compreender que a revolução na Europa Ocidental teria que se desviar muito do rumo seguido pelos bolcheviques russos. Nesse sentido, ofereceu um novo “Que Fazer” ao Ocidente desenvolvido. Aquilo que ele chamou de “sociedade civil” – rede de instituições educativas, religiosas e culturais que disseminam modos de pensar – era, na Rússia, incapaz de fornecer uma doutrinação moral e intelectual de caráter unitário, uma vez que o Estado czarista fundamentava-se na ignorância, na apatia e na repressão, e não no consentimento voluntário dos súditos. Na ausência de uma articulação complexa da “sociedade civil” em condições de absorver a insatisfação, a única defesa da velha ordem era constituída pelo aparelho do Estado, que Gramsci denomina de “sociedade política”. O conjunto difuso da “sociedade civil”, que propaga a ideologia da classe dominante, não existia na Rússia.

Segundo Gramsci, o objetivo da batalha pela mudança é conquistar, um após outro, todos os instrumentos de difusão ideológica (escolas, universidades, editoras, meios de comunicação social e sindicatos), uma vez que os principais confrontos ocorrem na esfera cultural e não nas fábricas, nas ruas ou nos quartéis.

Dessa forma, Gramsci abandonou a generalizada tese marxista de uma crise catastrófica que permitiria, como um relâmpago, uma bem sucedida intervenção de uma vanguarda revolucionária organizada. Ou seja, uma intervenção do Partido. Para ele, nem a mais severa recessão do capitalismo levaria à revolução, como não a induziria nenhuma crise econômica, a menos que, antes, tenha havido uma preparação ideológica.

Segundo a linguagem colorida de Gramsci, o proletariado precisa transformar-se em força cultural e política dirigente dentro de um sistema de alianças, antes de atrever-se a atacar o poder do Estado-burguês. E o Partido deve adaptar sua tática a esses preceitos, sem receio de parecer que não é revolucionário.

Lênin sustentava que a revolução deveria começar pela tomada do Estado para, a partir daí, transformar a sociedade. Gramsci inverteu esses termos: a revolução deveria começar pela transformação da sociedade, privando a classe dominante da direção da “sociedade civil” e, só então, atacar o poder do Estado. Sem essa prévia “revolução do espírito”, toda e qualquer vitória comunista seria efêmera.

Para tanto, Gramsci definiu a sociedade como “um complexo sistema de relações ideais e culturais” onde a batalha deveria ser travada no plano das idéias religiosas, filosóficas, científicas, artísticas, etc. Por essa razão, a caminhada ao socialismo proposta por Gramsci não passava pelos proletários de Marx e Lênin e nem pelos camponeses de Mao-Tsetung, e sim pelos intelectuais, pela classe média, pelos estudantes, pela cultura, pela educação e pelo efeito multiplicador dos meios de comunicação social, buscando, através de métodos persuasivos, sugestivos ou compulsivos, mudar a mentalidade, desvinculando-a do sistema de valores tradicionais, para implantar os valores ateus e materialistas.

O comunismo de Gramsci é a “versão ocidental” do comunismo, e ao proclamar o diálogo e aceitar o debate, próprios dos sistemas verdadeiramente democráticos, trabalha sobre todas as formas de expressão cultural, atuando sob a cobertura do pluralismo, com a contribuição de todos aqueles que por compartilhar a ideologia marxista, por snobismo, por conveniência ou por negligência, se somam voluntária ou involuntariamente a essa nova expressão do “frentismo”, chamando “fascistas” ou “retrógados” aqueles que se opõem a essa forma de pensar e atuar.

Nessa confusão de idéias, chega-se a substituir a contradição hegeliana de “burguês – proletário” (tese e antítese) pela de “fascista – anti-fascista”. O inimigo não é patrão e sim o fascista. Assim surge o mito do fascismo, que nada tem a ver com o fascismo histórico, sem dúvida questionável.

Quem quer que defenda os valores tradicionais da cultural ocidental é tachado de “fascista” e considerado genericamente como “um mal”. O grande erro dos comunistas, segundo Gramsci, foi o de crer que o Estado se reduz a um simples aparato político. Na verdade, o Estado atua não apenas com a ajuda do seu aparato político, como também por meio de uma ideologia que descansa em valores admitidos que a maioria dos membros da sociedade têm como supostos. A referida ideologia engloba a cultura, as idéias, as tradições e até o sentido comum. Em todos esses campos atua um poder no qual também se apóia o Estado: o poder cultural.

A necessidade de uma reforma intelectual e moral para lograr uma mudança de mentalidade nas sociedades ocidentais que foram constituídas por convicções, critérios, normas, crenças, pautas, segundo a concepção cristã da vida, é de suma importância para o triunfo da revolução mundial.

Porém, nesse propósito de formação de uma nova consciência proletária, o gramscismo encontra um obstáculo: a religião. De acordo com os estudos de Gramsci, a Igreja Católica, encarada como inimiga irreconciliável do comunismo, utiliza elementos fundamentais e comuns na sociedade, chegando a toda população, tanto urbana como rural. O catolicismo, segundo Gramsci, é uma doutrina geral simplificada a fim de ser entendida por todos. Analisando esse fato, Gramsci chegou à conclusão que uma das chaves da sobrevivência do catolicismo ao longo dos séculos foi o fato de que em seu seio conviveram harmonicamente humildes e elites, sentenciando que “a Igreja romana sempre foi a mais tenaz em impedir que oficialmente se formem duas religiões: a dos intelectuais e a das almas simples”.

Concluiu que é a Igreja Católica que inspira a formação desse sentido comum cristão e, por conseguinte, era preciso erradicá-lo mediante uma ação não violenta já que essa via seria repelida pelas sociedades ocidentais, onde influi e gravita o consenso e a vontade das maiorias. Gramsci afirmou que “os elementos principais do sentido comum são ministrados pelas religiões e, por isso, a relação entre o sentido comum e a religião é muito mais íntima do que a relação entre o sentido comum e os sistemas filosóficos dos intelectuais”. “Então - prossegue Gramsci – todo o movimento cultural que tenda a substituir o sentido comum e as velhas concepções do mundo deve repetir incansavelmente os próprios argumentos, variando suas ‘formas’”.

Dessa forma, as novas concepções se difundem utilizando sofismas, dando novas interpretações a fatos históricos e chegando a parafrasear o Evangelho em alguns casos, mostrando distintos “ensinamentos” de determinadas passagens bíblicas, tal como a expulsão dos mercadores do Templo de Deus, utilizando-os como argumentos para justificar a violência e fortalecer a imagem do “Cristo guerrilheiro”, criada pelos “cristãos revolucionários”.

Essas concepções, porém, não deverão ser apresentadas em formas puras, uma vez que o povo não as aceita na medida que provoquem uma mudança traumática. Para isso, devem ser apresentadas como combinações, explorando “a crise intelectual e a perda da fé na concepção que se deseja mudar”.

Por isso, diz Gramsci, não se deve enfrentar frontalmente a Igreja Católica, e sim criar os enfrentamentos em seu seio. Enfrentamentos que não sejam apresentados como provocados por causas exógenas e sim endógenas.

Acrescente-se que o marxismo de Gramsci se apresenta como uma interpretação “filosófica” distinta do marxismo conhecido. Não há filosofia e práxis; existe uma igualdade entre pensamento e ação ao ponto em que tudo é considerado ação. Em conseqüência, a “filosofia da práxis” deve ser elaborada partindo de uma equivalência entre filosofia e política, e deverá ser construída como ciência da história, posto que filosofia e história são indissociáveis. Diz Gramsci que “a filosofia da práxis supera as precedentes, por isso é original, especialmente porque abre uma via completamente nova, ou seja, renova totalmente o modo de conceber a filosofia mesma”.

Quanto ao papel dos intelectuais, ele deixa claro que a tarefa de agente da mudança na nova concepção de mundo não pode ser desenvolvida pelos intelectuais burgueses, considerados “o elo mais débil do bloco burguês”. Devem surgir “novos” intelectuais da massa do povo. Dessa forma, a tarefa a ser desenvolvida por essa “nova” elite será a de formar uma vontade coletiva e lograr a reforma moral e intelectual, agregando que uma reforma cultural que eleve os extratos submersos da sociedade não pode ocorrer sem uma prévia reforma econômica e uma mudança na sua posição social. Por isso, afirmou que “uma reforma intelectual e moral tem que ser vinculada forçosamente a um programa de reforma econômica”.


Gramsci e o MST

Denis Lerrer Rosenfield, O Estado de S. Paulo (13/12/04)

O MST, para quem sabe ler, é um movimento revolucionário, que procura destruir o capitalismo e a democracia representativa. Uma tal afirmação pode parecer repetitiva, porém repetitivo é o discurso de nossos governantes, que não cessam de assegurar que esse movimento é "social", respeitoso das regras democráticas, tendo abdicado do uso da violência. O MST, ao contrário de seus defensores, não esconde os seus objetivos, tendo o mérito da clareza. Seus documentos são suficientemente eloqüentes.

Um deles, cujo título é Neutralização das 'trincheiras' da burguesia brasileira, coloca as etapas que devem ser seguidas para que o Brasil venha a ser uma sociedade como a "cubana", digna de tantos elogios. Em vez do uso imediato das armas, é proposta a utilização de um outro tipo de "armas", o que advém das palavras e dos discursos, segundo um trabalho lento e meticuloso de enfraquecimento das instituições republicanas. A democracia seria, então, nada mais do que um instrumento que serviria para a sua própria eliminação.

Reproduzo o primeiro parágrafo: "Conforme o gramscismo, o 'grupo dominante' da burguesia brasileira se protege em algumas 'trincheiras' que precisarão ir sendo eliminadas através da desmoralização, perda da credibilidade, perda de prestígio, do 'denuncismo', da dissidência interna, do 'patrulhamento', da penetração de intelectuais orgânicos, do constrangimento, da inibição, etc." (Os grifos são do documento.)

O MST afirma seguir os ensinamentos de Gramsci, com o uso explícito de seus conceitos. Trata-se de travar uma batalha pela formação da cabeça das pessoas, de modo que a mensagem revolucionária possa ser progressivamente implantada. Se instituições republicanas perdem a sua credibilidade e o seu prestígio, o império da transgressão e das invasões pode ser mais facilmente aceito. Os intelectuais, como vemos em parte da intelligentsia de nosso país, se colocariam - ou são colocados - nessa posição de instrumentos da ação revolucionária, que ganharia assim credibilidade. Os que se opõem a esse movimento são, então, "constrangidos" e "inibidos", como se ser contra o MST fosse ser de "direita", contra a "justiça social". O objetivo de tal estratégia consiste em calar a contestação.

Observe-se igualmente o vocabulário militar utilizado. Nesse documento, a palavra "trincheira" aparece no próprio título e, nas cartilhas "pedagógicas", voltadas para as crianças, a palavra "guerra" é a de uso mais freqüente. Aliás, poder-se-ia perguntar: onde anda o Ministério Público na defesa dos jovens, fazendo respeitar o Estatuto da Criança e do Adolescente? Será que jovens preparados para a guerra, acostumados com a violência das invasões, tendo Fidel e Guevara como ídolos, estão sendo valorizados?

Os exemplos dados para essa guerra de captura das mentes são vários. Destacarei três "trincheiras": Judiciário, Congresso e Forças Armadas. Cada uma delas tem uma série de "idéias-força", sendo seguidas de "temas explorados". As "idéias" são as armas que preparam o terreno para o descrédito das instituições republicanas, enquanto os "temas" correspondem ao modo de inviabilizá-las concretamente, comprometendo de forma definitiva a democracia.

Quanto ao Judiciário, as "idéias-força" são: "instrumento de opressão", "parcialidade", "ineficiência" e "improbidade". Os "temas explorados" são: "favorecimento dos ricos", "privilégio dos burgueses (e dos colarinhos-brancos)", "lentidão funcional" e "corrupção e privilégio dos magistrados". Quanto ao Congresso, eis as "idéias": "ineficiência", "improbidade" e "parasitismo". E os "temas": "privilégios e ociosidade", "escândalos e barganhas" e "falta de espírito público". Quanto às Forças Armadas, eis as "idéias": "ineficiência", "desnecessidade", "ônus para o País" e "fascismo". E os "temas": "destinação", "acidentes de trabalho", "golpismo, ditadura e tortura" e "serviço militar obrigatório".

Todas essas colocações se inscrevem num mesmo menosprezo pelas instituições que são pilares de uma democracia e por um Estado que cumpra suas obrigações constitucionais. A concepção que as orienta é a de um marxismo vulgar de cunho gramsciano, que reduz as instituições republicanas à mera expressão da luta de classes. Os alvos escolhidos privilegiam, cada um, seja o capitalismo (burgueses, ricos), seja a representatividade política e estatal (parcialidade, parasitismo, ineficiência, fascismo).

Segundo essa concepção, a democracia nada mais seria que formal e o capitalismo, o regime socioeconômico a ser destruído. Num procedimento típico dessa forma de autoritarismo revolucionário, os adversários são considerados "fascistas". Numa outra "trincheira", a dos "partidos políticos", estes são também qualificados de "fascistas". Ou seja, uma mentalidade fascista-comunista, seguindo o molde do marxismo vulgar, cunha instituições republicanas como "fascistas" com o propósito explícito de vir a estabelecer uma sociedade totalitária no País. A fachada do "social" é apenas a apresentação que torna mais palatável, para o estágio presente da opinião pública, a veiculação de concepções que têm como fim combater as idéias democráticas. É como se o MST estivesse dizendo: "Essas instituições não servem para nada." Será que é tão difícil escutar esse dizer?!

Qualquer semelhança com "idéias" e "temas" da situação presente é, evidentemente, mera coincidência.

Denis Lerrer Rosenfield, professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com doutorado de Estado em Filosofia pela Universidade de Paris, é autor, entre outras obras, de Hegel (Jorge Zahar Editor, Coleção Passo a Passo) e editor da revista Filosofia Política, da mesma editora. E-mail: denisrosenfield@terra.com.br

Thursday, May 18, 2006

Il gobbo visto por alguns de seus fãs brasileiros e o resumo do problema que enfrentamos

"Nos últimos vinte anos, o italiano Antônio Gramsci foi, certamente, um dos autores estrangeiros mais lidos e debatidos no Brasil. Deveu-se a ele, em grande parte, a renovação do pensamento marxista entre nós, renovação que tornou possível conservar vivo o legado de Marx numa época marcada pela ofensiva das correntes neoliberais e conservadoras. E a influência de Gramsci não se limitou ao terreno da política: suas instigantes categorias ingressaram também na Universidade, tornando-se referência obrigatória para os estudiosos de quase todos os campos das ciências sociais, particularmente os da pedagogia e do serviço social."

Carlos Nelson Coutinho, no artigo Gramsci: sua teoria, incidência no Brasil, influência no Serviço Social, publicado em http://www.artnet.com.br/gramsci/arquiv18.htm

* * *

"Nas notas constantes desse quarto tomo dos “Cadernos”, manifesta-se o tempo todo a convicção de que a luta pela hegemonia é longa e complexa, não pode esperar a conquista do Estado para ser travada, exige o fortalecimento do poder de persuasão por parte dos revolucionários, precisa de um bom embasamento teórico e suas vitórias decisivas passam pela esfera da cultura.

Nenhum marxista antes de Gramsci havia reconhecido uma importância política tão grande na batalha das idéias, nos conflitos culturais. Para o teórico italiano, o avanço e a consolidação do movimento dos trabalhadores, numa sociedade de tipo “ocidental”, depende de uma sempre difícil “guerra de posições”, depende de um bom planejamento, de uma eficiente organização, quer dizer, depende de conhecimentos, necessita de uma sólida preparação.

Ao contrário da “guerra de movimentos”, que se faz muitas vezes com manobras súbitas de pequenos grupos, com ações fulminantes de minorias (agindo em nome da maioria), que se serve de golpes de mão, a “guerra de posições” exige a participação ampliada, a construção do consenso.

Na “guerra de posições” cada avanço precisa ser bem calçado. A mobilização só pode ser suficientemente profunda e ter efeitos duradouros se puder se apoiar em consciências coesas e articuladas, em um pensamento rigoroso e lúcido. A transformação da sociedade, nas condições da complexidade moderna, não poderá seguir um caminho revolucionário se não aproveitar as lições proporcionadas pelos duelos da política cultural.

Em outras palavras, para passar da rebeldia à revolução, da contestação à construção de alternativas, a perspectiva com que os socialistas enfrentam os combates que travam pelo fortalecimento da “sociedade civil” necessita de instrumentos teóricos e de uma competência argumentativa que só poderão ser desenvolvidos no campo de batalha da cultura.

E Gramsci dá indicações metodológicas preciosas para a ação revolucionária nesse campo."

Leandro Konder, Gramsci e a crítica da modernidade. Jornal do Brasil, 2 jun. 2001. Caderno Idéias-Livros, p.8 ; disponível em http://www.artnet.com.br/gramsci/arquiv163.htm

* * *

Entrevista de Carlos Nelson Coutinho, realizada por Maurício Santana Dias, e publicada pela Folha de S. Paulo. Alguns depoimentos de pseudo intelectuais brasileiros; passagens de um artigo de Sérgio Paulo Rouanet. Fonte: Folha de S. Paulo. Caderno Mais!, 21 nov. 1999.
Disponível em
http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=326

Folha - Em fins dos anos 60, grande parte da esquerda radicalizou suas ações contra o regime militar e partiu para a luta armada -- sob a influência de Mao, Trotski e Fidel Castro. Isso teria contribuído para o "pé atrás" em relação às teorias gramscianas?

Coutinho - Muito provavelmente. Gramsci propunha algo diverso: para ele, em países mais complexos socialmente, como já era o caso do Brasil naquele momento, a estratégia era outra. Em vez da luta armada, da "guerra de movimento", devíamos adotar a "guerra de posição", a luta progressiva pela hegemonia etc. O PCB até fazia isso, mas o fazia tão mal que era difícil convencer quem não fosse um disciplinado militante. Assim, num terreno marcado pela disputa entre Mao, Fidel e Brejnev, não havia nenhum lugar para Gramsci, o que foi péssimo para a esquerda brasileira. Só no final dos anos 70 é que Gramsci voltou a ser lido e a ter influência. Isso ocorreu sobretudo porque, naquele momento, entraram em crise tanto o "sovietismo" do PCB quanto as ilusões da chamada "esquerda armada".

Folha - Em que medida os conceitos gramscianos de "hegemonia" e "sociedade civil" renovaram o pensamento marxista?

Coutinho - Foi principalmente por causa deles que o marxismo se tornou contemporâneo do século 20 e, espero, também do século 21. Gramsci percebeu que, a partir da segunda metade do século 19, havia surgido uma nova esfera do ser social capitalista: o mundo das auto-organizações, do que ele chamou de "aparelhos privados de hegemonia". São os partidos de massa, os sindicatos, as diferentes associações -- tudo aquilo que resulta de uma crescente "socialização da política". Ele deu a essa nova esfera o nome de "sociedade civil" e insistiu em que ela faz parte do Estado em sentido amplo, já que nela têm lugar evidentes relações de poder. A "sociedade civil" em Gramsci é uma importante arena da luta de classes: é nela que as classes lutam para conquistar hegemonia, ou seja, direção política, capacitando-se para a conquista e o exercício do governo. Ela nada tem a ver com essa coisa amorfa que hoje chamam de "terceiro setor", pretensamente situado para além do Estado e do mercado.

Ao descobrir essa nova esfera, ao dar-lhe um nome e ao definir seu espaço, Gramsci criou uma nova teoria do Estado. O Estado, para ele, não é mais o simples "comitê executivo da burguesia", como ainda é dito no Manifesto Comunista, mas continua a ser um Estado de classe. Contudo, o modo de exercer o poder de classe muda, já que o Estado se amplia graças à inclusão dessa nova esfera, a "sociedade civil". Buscar hegemonia, buscar consenso, tentar legitimar-se: tudo isso significa que o Estado deve agora levar em conta outros interesses que não os restritos interesses da classe dominante. Com isso, Gramsci chegou a compreender o tipo de Estado que é próprio dos regimes liberal-democráticos, um Estado bem mais complexo do que aquele de que falam Marx e Engels no Manifesto ou Lenin e os bolcheviques no conjunto de sua obra.

Folha - Os cadernos foram escritos antes que houvesse TV, Internet, mídia eletrônica -- o que se tem chamado de "quarto poder". Como um gramsciano avaliaria a emergência desse novo fenômeno?

Coutinho - Na medida em que o mundo da mídia continua a ser propriedade privada de pequenos grupos da classe dominante, isso provoca um indiscutível desequilíbrio na disputa pela hegemonia. A nova mídia eletrônica, sobretudo a TV, tem um peso inegável na formação da opinião pública, na construção da cultura que está na base das relações de hegemonia. Mas essa nova mídia também está imersa na sociedade civil e sofre sua influência. Lembro que, na campanha pelas Diretas-já, em 84, a Globo começou simplesmente ignorando o movimento. Mas, a partir de um certo momento, à medida que a campanha se tornava de massa, não só foi pressionada a "repercutir" a campanha, mas até mesmo assumiu um tom simpático a ela.

Também aqui, portanto, trata-se de lutar pela conquista de espaços no interior da mídia, o que significa lutar por sua efetiva democratização. Isso implica não só uma pressão da opinião pública, mas também a elaboração de uma legislação adequada, que desprivatize o controle da mídia e o torne efetivamente público. Isso não é sinônimo de estatização, mas sim de controle efetivo pela sociedade civil. Se o rádio e a televisão são uma concessão pública, devem evidentemente ser publicamente controlados. Em suma, um gramsciano veria o mundo da mídia como mais um espaço de luta pela hegemonia. Nesse sentido, ele estaria mais próximo de Benjamin, que supunha ser possível utilizar revolucionariamente a "reprodutibilidade técnica" da cultura, do que de Adorno e Horkheimer, que condenam em bloco o que chamam de "indústria cultural".

* * *

JOSÉ GENOÍNO, deputado federal (PT-SP): "Gramsci é uma referência importante para o pensamento de esquerda, um dos que mais contribuíram para renovar o marxismo neste século, tendo introduzido o conceito de "hegemonia" -- em oposição à idéia de "assalto ao poder". Alguns pontos estão superados, como as bases do dogmatismo marxista. A esquerda tem de ter uma relação de independência com esses textos, tomá-los como referência para uma releitura diante de um novo contexto. A cultura da esquerda em nosso país é muito fraca. Essa publicação ajudará a melhorar a qualidade do debate."

FREI BETTO, frade dominicano e escritor: "Considero Gramsci mais atual que nunca, porque foi dos poucos teóricos a tratar a questão da subjetividade e da cultura no processo histórico. A queda do Muro de Berlim, a meu ver, resultou do fracasso de se tentar construir coisa nova com material velho. A proposta era boa, conseguiu criar direitos sociais razoavelmente igualitários, porém não se trabalhou a questão da subjetividade e sua expressão na formação da sociedade civil e da democracia. Particularmente me encanta em Gramsci a ótica despreconceituosa diante do fenômeno religioso, o que é raro nos teóricos marxistas da primeira metade do século."

SERGIO PAULO ROUANET, A democracia cosmopolita

" No início dos anos 60, um conhecido filósofo marxista disse que era preciso "gramscianizar" o Brasil. Pouco tempo depois, seus sonhos mais ambiciosos tinham sido ultrapassados pela realidade. Seria um exagero dizer que o Brasil tinha se "gramscianizado", mas o certo é que da noite para o dia quase toda a esquerda brasileira começou a usar expressões como "intelectual orgânico", "bloco histórico" e "hegemonia".

(...)É nesse momento que aparece Gramsci, dizendo que a classe operária só poderia chegar ao poder depois que os intelectuais tivessem logrado dissolver a hegemonia existente. Graças a Gramsci, os intelectuais recebiam uma missão, a de difundir uma nova concepção do mundo; um cargo, o de "funcionários da superestrutura"; e um espaço de atuação, a sociedade civil, atravessada por instituições como a família, a Igreja, a escola, a universidade, o jornalismo, o rádio e a televisão."